16/07/2010

Você está preparado?

- Você está preparado?

Perguntou a Sumaúma ao pesquisador, que com um gesto da mão havia autorizado o lenhador a ligar a serra elétrica, que derrubaria a centenária árvore de quase quarenta metros de altura.

Intrigado por ouvir uma árvore falando, e rememorando se havia tomado o caldo de algum cipó que pudesse criar esses tipos de alucinações, o cientista decidiu romper todos seus paradigmas acadêmicos e interrogar a vítima de seus experimentos:

- Desculpe, não entendi.

- Você está realmente preparado para isso? Sua mente está realmente quieta, estabilizada e realizada? Completou a árvore.

Atônito o cientista não sabia o que dizer, as palavras sumiram de sua boca. Logo ele, mestre da arte de responder questões e testar hipóteses.

Seu caminho até aquele momento não havia sido fácil, para se tornar realidade seu projeto de doutorado demandou muitas escolhas difíceis e o forçou a abrir mão de uma companheira querida e de uma oportunidade profissional promissora. E agora aquele ser, sem o menor pudor, questionava suas qualificações.

- Sou pesquisador da área ambiental, meu trabalho busca identificar os principais pontos de sustentação do equilíbrio que se estabelecem em uma floresta tropical madura. Minha hipótese é de que uma vez entendidos esses pontos, intervenções no bioma poderão ser feitas, de forma a minimizar os impactos de uma ocupação antrópica.

O vento soprou forte, fazendo tocar a melodia natural composta pelos ocos das árvores.

- Sim, mas eu perguntei se VOCÊ está preparado – insistiu a Sumaúma.

- Meu trabalho está em fase avançada, dentro do cronograma inicial que previa a coleta de dados em campo para o terceiro trimestre e...

- Sim, eu entendi, é o equilíbrio que você busca. Deixe-me melhorar a pergunta: sua mente está equilibrada?

- Completamente! Disse o pesquisador em tom ríspido, já se cansando daquela baboseira.

- Então pode me derrubar! Bradou a árvore.

Surpreso com entrega tão verdadeira, o pesquisador não conseguiu seguir com seu plano, ao invés disso perguntou:

- Você poderia me dizer algo sobre o equilíbrio?

- Ah! Então você também sabe usar o ponto de interrogação? Brincou a árvore antes de continuar: o equilíbrio aqui não se estabelece como aparentemente se pensa. Não estamos competindo, mas também não estamos nos ajudando. Não somos organismos separados, mas também não estamos sós. A cada novo instante a floresta envelhece e envelhecemos com ela, inclusive as novas sementes, que ainda nem germinaram. Meu esforço é de adaptação as condições que se estabelecem a cada novo momento, dinamicamente. Olhando de fora parece que existe um grande caos estabelecido nesse ambiente; esse caos é gerado no processo de manutenção da vida, mas também combatido continuamente por essa mesma vida. Dessa forma, os pontos de equilíbrio se alteram sempre que necessário e assim tem sido desde que essa grande brincadeira começou a alguns bilhões de anos atrás.

- Muito diferente do mundo de onde venho. Deixou escapar o cientista.

- É mesmo? Eu imagino que vocês estejam buscando pelo equilíbrio também, todos juntos, mas cada um por si. Afirmando e reafirmando a individualidade como maior dos benefícios e buscando através da realização pessoal a sonhada prosperidade. Dessa forma, a princípio egoísta, constrói-se uma sociedade mais rica cultural e economicamente, que se adapta as condições impostas pela constante mudança ocasionada pelo envelhecer do universo. Não cometa o mesmo erro de outros, em achar que o equilíbrio possa ser imposto a entidades que atuam através da desorganização. Se você quiser realmente encontrar o equilíbrio pelo qual busca, terá de procurá-lo além da sua mente, onde a essência de tudo que existe está guardada. A nossa Essência comum.

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