11/03/2007

Nem tudo que é fumaça é fogo...

Sentado em meditação sou como o Everest,
mas pelas ruas desfilo como um bobo.

Dessa forma pareço um tanto passivo,
como se carregasse o peso alheio nos ombros.

Na sociedade sou como uma cobra que esguia rapidamente pela floresta,
sem fazer ruídos pode ir facilmente onde quiser sem esforço.

Quando converso com alguém sou o mais temível caçador,
escondido sobre um sorriso inocente e voz suave.

Deixo as palavras jorrarem como uma cachoeira enquanto aguardo o momento correto,
então com um golpe preciso a espada decepa a ilusão.

Quando me perguntam o que espero da vida, respondo apenas que é a vida que nos espera.
Dessa forma conheço todo o Universo sem nunca deixar meu quarto.

Recebo os anjos e demônios com a calma e paciência de um escultor,
apenas por saber que ambos são a mesma essência, manifesta sob diferentes condições.

Como um bambu oco deixo minha mente aberta a todas as possibilidades,
sem me prender a alguma personalidade em particular posso ser todas sem ser nenhuma.

Transparente como o ar e brilhante como um espelho limpo, a consciência permanece.

Os lados extremos parecem destoar entre si, como se tristeza e felicidade fossem opostas,
mas eliminando os julgamentos tudo se encaixa dentro da mesma realidade,
como o ano que encaixa em si as quatro estações.

Quando acordo confiante caminho com a cabeça baixa.
Quando acordo receoso caminho de peito aberto.

Dessa forma mantenho o equilíbrio e desvio das pedras apenas deixando a correnteza conduzir o fluxo.

Não que seja inerte, minha tarefa é a mais árdua de todas as tarefas: confiar.

Enfrento os desafios e agarro as oportunidades, só para descobrir que os limites estão sempre mais distantes do que posso imaginar.

Sob o julgamento de outros olhos posso parecer dúbio,
mas o centramento correto permite agir sempre com a certeza correta.

Conhecendo os repetitivos padrões de comportamento é possível optar ou não em se envolver com as situações.

Assim nos solitários finais de domingo, quando todas as esperanças, anseios e promessas ficam reservadas para a semana seguinte, deito a cabeça no colo da existência e ela carinhosamente afaga meu cabelo.

Como certa vez disse um velho Buda:

Meus olhos são frios como cinzas mortas,
minhas palavras vagas e dispersas,
mas meu coração, ahhhh meu coração, esse sim, arde como fogo!

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O velho Buda a qual me refiro no texto é Soyen Shaku, primeiro mestre Zen Budista a ensinar nos Estados Unidos no início do século passado. Agradeço profundamente sua compaixão por deixar tão preciosos ensinamentos. Mãos em prece.

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